O que mitos e histórias nos ensinam sobre a ancestralidade?
Sendo a Amazônia de proporções tão grandes, maior até que alguns países, suas características também são diferentes. Histórias mitológicas do Estado do Acre, por exemplo, podem não ser conhecidas em Santarém, no Pará; e tudo ainda acontece dentro do bioma da floresta amazônica.
Normalmente as histórias de um povo trarão seus mitos de criação, que vão relatar como surgiu o mundo e como surgiram os seres vivos. Mas nem todas as histórias que falam da ancestralidade são mitos de criação.
Na Amazônia acreana, por exemplo, existe um personagem mitológico indígena que é chamado de Mapinguarí.
Trata-se de um monstro, que vai variar em suas descrições. Às vezes contam como se fosse um bicho preguiça gigante, outras vezes como um grande índio engolidor, mas escolhemos aqui a descrição do dicionário folclórico de CASCUDO (Luís Câmara,2012).
Como nesta reflexão nos interessa em específico o tema da ancestralidade, destacamos uma possível metáfora existente na ferramenta de caça do monstro Mapinguarí. Ele se alimenta de humanos, especialmente, caçadores na floresta. Tem uma boca no estômago, com a qual engole suas vítimas e uma característica curiosa é a que quando emite seu som, este vem do lado oposto em que ele está. Assim, os caçadores ouvem um som forte, alto e gutural assustador e correm atrás dele, mas na verdade estão indo em direção ao próprio monstro, pois o som vem do lado oposto em que está o ser, atraindo as vítimas para sua boca engolidora.
Podemos pensar na metáfora de alguém, ou até mesmo de uma raça inteira, como os humanos, que tendem a fugir do problema. Não encarar, até mesmo por medo, mas acabam caindo na mesma problemática da qual fugiam.
Uma proposta psicológica por exemplo seria a de Carl Jung onde ao invés do indivíduo evitar se parecer com aquilo que ele não gosta em sua família, entrar em contato, ouvir as histórias da família, de seus antepassados e compreender o sentido do que considera ruim em sua família. Ao invés de tentar esquecer, ampliar este conhecimento; buscar saber mais. Neste sentido, Jung fala que o próprio sistema psíquico poderia restaurar o equilíbrio (JUNG, C. G. OC 18, §389).
Parece-nos que a dinâmica do Mapinguarí se assemelha a outro mito tupi-guarani, a do Curupira, que seguindo suas pegadas, parece estar indo para trás, quando na verdade está indo para frente.
Concluímos assim que, fugir do problema é apenas postergar o encontro com o problema. Ir ao encontro do problema é a possibilidade de resolução.
CASCUDO, L. C. – Dicionário do Folclore Brasileiro . Global editora, 2012
JUNG, C.G. – Fundamentos da Psicologia Analítica. Vozes, 2000.