Sabemos que para Jung ter percebido questões com tamanha profundidade e construído sua psicologia, ele teve de passar por períodos bem difíceis. O confronto que ele viveu com o inconsciente aconteceu principalmente após os 38 anos de idade. Até essa fase ele havia se dedicado à construir sua vida social, familiar e profissional de forma bem estruturada.
Por volta desse período houve o rompimento com Freud e o grupo psicanalítico, o que para ele representou um momento de confusão em que ele se sentia desorientado.
Nessa nova fase iniciou-se um período difícil de solidão e ao mesmo tempo de ativação do inconsciente. Jung percebeu que a abertura à essas imagens interiores era fundamental para sua vida e consequentemente para o desenvolvimento de conteúdos essenciais da psicologia analítica. Mas a experiência de contato com o inconsciente é intensa e possui uma força de atração poderosa. Por isso Jung afirmava que para vivenciar essa tarefa com êxito é preciso estar bem estruturado para não perder o contato com a realidade, caso contrário, haverão maiores riscos. Sua vida pode perder-se de direção, de significado e de equilíbrio, chegando até à beira de uma possível psicose.
Nise da Silveira fez uma referência à esse assunto (1981, p 13)
Para que o indivíduo não seja tragado pelo inconsciente, adverte Jung, é necessário manter-se firmemente enraizado na realidade externa, ocupar-se de sua família, de sua profissão. E, sem perder o ânimo, encarar face a face as imagens do inconsciente. Certo, a tarefa é difícil. Para levá-la a termo sem nenhuma ajuda, segundo Jung o conseguiu, o requisito prévio será a existência de um ego bem estruturado e coeso, pois o processo inconsciente terá de ser continuamente ligado ao consciente.
Também encontramos diversas outras menções de Jung com relação à isso.
Naturalmente, nessa época em que trabalhava em torno das minhas fantasias, senti a necessidade de um “apoio neste mundo”: ele me foi dado por minha família e pelo trabalho. Era vital e necessário levar uma vida ordenada e racional como contrapeso à singularidade do meu mundo interior. A família e a profissão permaneceram para mim uma base à qual eu sempre podia regressar, provando que eu era realmente um homem existente e banal. […] Por mais absorto que estivesse em meus pensamentos e tangido por eles, sempre lembrava que toda experiência vivida dizia respeito à minha vida real, cuja extensão e sentido eu buscava cumprir. […] Assim é que minha família e minha profissão sempre foram uma realidade dispensadora de felicidade e a garantia de que eu existia de uma forma normal e verdadeira. (Jung, C. G., 2006, p. 218).
Referências Bibliográficas:
JUNG, Carl Gustav, Memórias, sonhos, reflexões; organização e edição Aniela Jaffé. 13 ed. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006
SILVEIRA, Nise da, Jung: vida e obra. 7 ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981
Texto: Alessandra M. Esquillaro – Psicóloga CRP 06/97347